segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Habermas no Correio Braziliense, dia 09.09.09

HABERMAS: POTÊNCIA MUNDIAL

Barbara Freitag
Em 18 de junho último, Jürgen Habermas, o filósofo alemão, herdeiro da teoria crítica da escola de Frankfurt, completou 80 anos de idade. Nessa data, o semanário liberal Die Zeit dedicou –lhe amplo dossiê com uma manchete de primeira página, intitulada “Weltmacht Habermas”, que em tradução aproximada seria algo como “Habermas: potência mundial”.
O jornal regional Süddeutsche Zeitung, editado em Munique, foi um pouco mais modesto, saudando-o no dia de seu aniversário com a Manchete: “Maior do que a República Federal” e acrescentando no subtítulo: “Felicitamos não um filósofo de Estado, mas um teórico e prático da esfera pública.”
O jornal conservador de Frankfurt faz perguntou em artigo de página inteira: “Quem fala quando Jürgen H. fala? A guerra civil semântica continua.” A rádio Vaticano lembrou seu diálogo sobre Razão x religião (2004) com o então cardeal Ratzinger, hoje papa Bento XVI, entrevistando o Dr. Florian Schüller, que organizara o encontro entre o teólogo e o filósofo, identificando-o como o “sismógrafo do nosso tempo”.
A Folha de São Paulo, em entrevista com o filósofo alemão, publicada no caderno mais (9/11/2008), intitulada “Habermas e a crise mundial”, logo após a eleição de Barak Obama para a presidência dos EUA, destaca sua visão da crise quando afirma que essa nação continua sendo “potência mundial”. A revista Cult (n. 136) de junho último dedicou dossiê “Habermas, 80 anos ao pensador da razão pública”, dando voz e vez a vários autores brasileiros, comentando a obra de Habermas. Em meados de setembro, a UFPB patrocinará o Congresso Internacional Habermas 80 anos, ao qual afluirão intérpretes da obra de Habermas do mundo e do Brasil.
Por essa relação esporádica e incompleta de manifestações e honrarias em torno do aniversariante, fica evidente que não estamos diante de uma pessoa qualquer nem mesmo de um filósofo de fama quer nem mesmo de um filósofo de fama com uma obra imensa. O que se reflete na imprensa internacional e nacional é a admiração por um pensador que é mais do que um profissional das ideias. Trata-se de um verdadeiro Weltbürger: cidadão do mundo, cuja opinião sobre tudo que acontece neste mundo tem peso e repercussão. Isso faz dele um intelectual no sentido sarteano, ou seja, aquele cidadão que participa de tudo que acontece de importante, catastrófico, aceitável e inaceitável no mundo. Mesmo não sendo chamado para opinar, mesmo não sendo um técnico e especialista, Habermas opina e julga como cidadão. É assim que é visto pelos colegas, amigos e inimigos que participaram dos muitos panegíricos, como foi o caso de Richard Sennett, Ronald Dworkin, Charles Taylor, Thomas Assheuer, Axel Honneth, Ahmet Cigdem,Christina Lafont e tantos outros. Segundo esta, “qualquer criança conhece o nome de Habermas” na Espanha. Isso porque ele é estudado nos ginásios na disciplina de filosofia, obrigatória no segundo grau.
De minha parte, gostaria de dar destaque pelo menos três aspectos da vida de obra de Habermas: seu peso teórico, seu engajamento político, sua discrição midiática, apesar das honrarias e badalações. E, nisso, não sou a única...
Seu engajamento político manifestou-se desde suas primeiras críticas a Heidegger, não por este ter-se envolvido com o nazismo (manifesto em sua conferência como reitor de Freiburg), mas por nunca ter-se retratado depois da Segunda Guerra Mundial, até o importante Historikerstreit, sua disputa com os historiadores que se preocuparam em banalizar Auschiwtz ou até mesmo a negá-lo. Mais recentemente, levantou a voz contra a manipulação genética do genoma (inseminação artificial e transplante de ógãos) sem respeitar regras e preceitos morais discursivamente acordados entre os manipuladores e os manipulados.
Em minhas entrevistas com o filósofo realizadas em Frankfurt (universidade), Starnberg (sua residência) E São Paulo (USP), ele deixou claro que, acima de todas as considerações personalísticas e midiáticas, seu interesse exclusivo volta-se para temas relevantes de hoje: a defesa do meio ambiente, o direito das mulheres, o combate ao terrorismo, a luta por uma democracia mundial capaz de superar o provincialismo e de defender os direitos do indivíduo e da humanidade como um todo. É o homem e o filósofo manifestando-se como “potência mundial”.

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